COMP.A N.AL EDITORA
SECÇÃO EDITORIAL
ADM. J. GUEDES—LISBOA
A questão social abrange muitos problemas, sendo evidentemente um dosprincipaes o da habitação. É tal a importancia d'elle, que pertence naactualidade ao numero dos assumptos que chamam mais a attenção, não sódos socialistas, como dos economistas e dos philantropos de todos oscentros da civilisação.
Não se busca a solução definitiva do problema da habitação, a qualdepende, como a de todos os outros problemas sociaes, das transformaçõespor que estão passando as sociedades contemporaneas, em obediencia á leihistorica da evolução; o eminente economista belga, Hector Denis, aindaha poucos mezes, no Congresso internacional das habitações operarias,effectuado na Belgica, demonstrou a necessidade, para se attingir odesejado fim, de uma transformação do regimen da propriedade. O que seespera n'este momento, é encontrar os meios praticos de fornecer aosoperarios, e em geral ás classes menos favorecidas, melhor habitação doque aquellas em que vivem, isto é, casas economicas e hygienicas.
Este problema, que preoccupa ha muito tempo, em todos os paizes, os quese interessam pela questão social, e ainda os que só desejam melhorar oviver dos proletarios, tem sido descurado em Portugal, nomeadamente emLisboa, o nosso primeiro centro operario.
Não ha casas baratas em boas condições hygienicas, casas para gentepobre, habitações para operarios!
Duas vezes por anno, invariavelmente, nos mezes de maio e novembro,ouve-se este clamor, sahido de todos os recantos da cidade, échoando naimprensa e extendendo-se uma ou outra vez até o seio da Camara Municipalde Lisboa ou do Parlamento.
Passados, porém, os dias 25 de maio e 25 de novembro,—dias em que osinquilinos teem de pagar aos senhorios a renda de uma casa, da qual sócomeçam a gosar 36 dias depois, anticipação esta que vae por vezes até41 dias, porque muitos senhorios exigem agora a renda no dia20,—passados esses dias, para os pobres frequentes vezes de tristeza elagrimas, o clamor que se ouvia distinctamente, esmorece e extingue-se,para reapparecer mezes depois, com a mesma intensidade e, em quantoscasos, com augmento de razão.
Desconsolador queixume!
Com effeito, a gente pobre, o proletariado, não encontra casas salubres,alegres e confortaveis.
Percorram-se em Lisboa os bairros onde de preferencia residem osoperarios, como, por exemplos a Alfama, esses restos immundos da cidadevelha1, ou a freguezia de Santos-o-Velho, algumas ruas em que seaccumula uma parte consideravel da população laboriosa; e o que se vê?
Pocilgas infectas e nauseabundas, sem ar, sem luz do dia, nem as maissimples condições de hygiene, exhalando cheiros deleterios, em ruasestreitas, tortuosas, onde, raras vezes, ou por poucos instantes, entraum raio de sol!
E vive-se alli?
Vive-se e soffre-se! E o que é mais e muito peor, procria-se!Multiplicam-se as gerações na miseria e no vicio, n'essa agglom