Produced by Vasco Salgado
J. Dumont
(Orlando)
(A proposito da injustificada condemnaçãodos marinheirospelos Conselhos de Guerra)
LISBOA
IMPRENSA GOMES
Rua do Sol ao Rato, 74
1906
Aos benemeritos defensoresdos infelizes marinheiros:
Dr. Nobre de Mello
" José d'Abreu
" Lomelino de Freitas
" Sarmento Osorio
" Borges de Sousa
" Irnaldo Monteiro
OFFERECE E DEDICA
+O auctor+
+A disciplina+
Emquanto cá por fóra o povo em romaria
Ia buscar ao campo a rustica alegria,
Emquanto os beberrões de capa de cambraia
Passeavam andor's nos sitios d'Atalaya,
Na torre negregada, a bastilha do mar,
Uma tragedia triste estava-se a passar.
Quem as ondas domou, domou o furacão,
Da tempestade riu e zombou do trovão,
Quem viu o vasto oceano em vagas tormentosas
Tornar em vivo inferno um lindo mar de rosas,
Quem nunca vacillou em arriscar a vida
Sustendo do gentio a rude arremettida,
Estava ali curvado, a fronte bem submissa,
Com sede de razão á espera de justiça.
Nas suas almas sãs de bravos marinheiros
Todos uma familia, amigos e companheiros,
Onde só a excepção pôz vis denunciantes,
Trastes sem cotação, emeritos tratantes,
Havia côr de rosa a lisongeira esp'rança
De ver luzir no céo o arco da bonança.
E quem estava ali ouvindo o julgamento,
Vendo tudo cahir sem base ou fundamento,
Quem via sossobrar a velha accusação
De tetrica revolta ou negra sedição,
Quem via que um protesto unanime, geral,
Fôra do movimento a causa inicial,
Calculava que o fim de tanta crueldade
Seria um acto bom de generosidade.
Porém, surgiu ali a D. Disciplina,
Cabello em desalinho, a garra que é tigrina
Adunca e collossal; a hysterica madona,
A serodia vestal, a bellica matrona,
Tinha sido offendida em seu pudor immenso,
Um pudor que rescende a perfumes e incenso.
Oh! não! bradou convulsa; oh! não, não póde ser?
Não póde haver piedade, eu quero-os ver soffrer!
Que importa o coração? Enterre-se a bondade,
É preciso um exemplo a toda a humanidade!
Soffram os bofetões, as rudes chibatadas,
Os dias no porão, as algemas fechadas,
Tenham do pão e agua o ephemero alimento,
Tudo o que o meu poder impõe como tormento!
Nem um gesto sequer de simples desagrado,
Senão, se ouço gritar… verão o resultado!
Esta torre aqui 'stá, conhece muita magua,
Nas humidas prisões entra em cachões a agua;
Quem não me obedecer ha de rolar no abysmo,
Morrerá como um cão, de dor's e reumathismo.
Findou a inquisição, diz se p'r'ahi a esmo.
A torre 'inda cá está, e vem a dar no mesmo!
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
E com immensa dôr, os peitos palpitantes,
Lagrimas o brotar de mães pobres velhinhas,
Na branca lividez de esposas soluçantes,
Nos choros infantis de pobres creancinhas,
Levantando a cabeça em gargalhada f'rina,
'Inda mais uma vez venceu a Disciplina!
*
Ó velha Disciplina, ó serodia vestal
De palmito e capella, os cabellos pintados,
A virginal gri