TRABALHADORES DO MAR

POR

VICTOR HUGO

traduzido por Machado de Assis

RIO DE JANEIRO
TYP.—PERSEVERANÇA—RUA DO HOSPICIO N. 91.
1866.

Indice


PRIMEIRA PARTE

O Sr. Clubin.


Dedico este livro ao rochedo de hospitalidade e de liberdade, a estecanto da velha terra normanda onde vive o nobre e pequeno povo do mar,á ilha de Guernesey, severa e branda, meu actual asylo, meu provaveltumulo.

V. H.


A religião, a sociedade, a natureza: taes são as tres lutas do homem.Estas tres lutas são ao mesmo tempo as suas tres necessidades; precisacrer, dahi o templo; precisa crear, dahi a cidade; precisa viver, dahia charrua e o navio. Mas ha tres guerras nestas tres soluções. Sahede todas a mysteriosa difficuldade da vida. O homem tem de lutar como obstaculo sob a forma superstição, sob a fórma preconceito e sob afórma elemento. Triplice ananke pesa sobre nós, o ananke dos dogmas, oananke das leis, o ananke das cousas. Na Notre Dame de Paris, o autordenunciou o primeiro; nos Miseraveis, mostrou o segundo; neste livroindica o terceiro.

A estas tres fatalidades que envolvem o homem junta-se a fatalidadeinterior, o ananke supremo, o coração humano.

Hauteville-House, março de 1866.


LIVRO PRIMEIRO

Elementos de uma má reputação


I

PALAVRA ESCRIPTA EM UMA PAGINA BRANCA

O christmas (Natal) de 182* foi notavel em Guernesey. Cahio nevenaquelle dia. Nas ilhas da Mancha, inverno em que ha neve, é memoravel:a neve é um acontecimento.

Naquella manhã de christmas a estrada que orla o mar de Saint-PierrePort au Valle assemelhava-se a um lençol branco: nevára desde a meianoite até o romper do dia.

Pelas nove horas, pouco depois de nascer o sol, como não era aindaoccasião dos anglicanos irem á igreja de Saint-Sampson e os wesleyanosá capella Eldad, o caminho estava quasi deserto. Na parte da estradacomprehendida entre a primeira volta e a segunda havia apenas tresviandantes, um menino, um homem e uma mulher.

Estes tres viandantes, caminhando separados, uns dos outros, não tinhamvisivelmente relação alguma entre si. O menino, de cerca de oitoannos parára e olhava para a neve com curiosidade. O homem, seguindoatras da mulher, uns cem passos, dirigia-se como ella, para o lado deSaint-Sampson.

Era elle moço ainda e parecia ser operario ou marinheiro. Vestia asroupas ordinarias, isto é, uma grossa camisa de panno escuro e umacalça de pernas alcatroadas, o que parecia indicar que, apezar dafesta, não iria á igreja. Os grossos sapatos de couro crú e solastaixadas de ferro deixavam sobre a neve uma marca, que mais seassemelhava a uma fechadura de prisão que ao pé de um homem.

A viandante, essa evidentemente trajava roupa de ir á igreja;envolvia-se em uma comprida manta acolchoada de estofo de seda preta,debaixo da qual apertava-lhe faceiramente o corpo um vestido de fazendada Irlanda com listas brancas e côr de rosa, e, se não fossem as meiasvermelhas, tomal-a-hiam por uma parisiense. Caminhava com desembaraçoe viveza; e pelo andar, que mostrava não lhe ter ainda pesado avida, conhecia-se que era moça. Tinha aquella graça fugitiva queindica a mais delicada transição, a adolescencia, a mistura dos douscrepusculos, o principio de uma mulher e o fim de uma men

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