QUADROS
DE
HISTORIA PORTUGUEZA
QUADROS
DE
HISTORIA PORTUGUEZA
POR
I. F. SILVEIRA DA MOTTA
SEGUNDA EDIÇÃO
correcta e augmentada
LISBOA
LALLEMANT FRÈRES TYPOGRAPHOS
6, Rua do Thesouro Velho, 6
1870
Em dous grandes cyclos póde naturalmente dividir-se a historia portugueza,cada um dos quaes abrange algumas epochas mais ou menos importantes; noprimeiro a nação constitue-se, desenvolve-se, fortifica-se, estende o seu poderpelas terras de Africa, senhoreia ignotos mares, dicta leis ao Oriente, ganhavastos e productivos terrenos na America, abre caminho ao engrandecimento dosoutros povos da Europa, e a final decae rapidamente{VI} até chegar á sepultura de 1580; no segundoresurge, reconquistando n'um dia a antiga independencia politica, e, procurandodepois rehaver no decurso de seculos não o poderio de outras eras, mas os fórosde liberdade, e a robustez e firmeza, que são os meios mais poderosos com queas nações, assim como os individuos, podem luctar contra a adversidade evencel-a.
Traçando este humilde esboço historico quiz o author rememorar alguns factose algumas phases do primeiro cyclo, que julga mais fecundo em lição e exemplos;e publicando-o agora suppõe fazel-o em occasião opportuna. Quando, no meio dasdissensões partidarias, dos erros politicos e das aberrações populares, nosfere os ouvidos a ameaça de que a nossa autonomia e independencia não podemdurar muito, é justo e util buscar no estudo dos{VII} fastos nacionaes os titulos do nosso direito, amemoria do que fizemos, e por ventura nobres estimulos para que os nossosprogressos intellectuaes e moraes mostrem ao mundo que, se já não somospotencia maritima ou continental, pesando com decisiva força na balança dosacontecimentos politicos, queremos, todavia, e devemos ser respeitados pelasciencia, pelo trabalho, pela energia, pelo amor da liberdade, pela severidadedos costumes, unicas armas com que o espirito da nossa epocha ensina as naçõescivilisadas a combaterem n'uma lucta generosa.
Possa esta tentativa não ser de todo perdida, e servir ao menos de incentivopara que obreiros mais robustos levantem o monumento grandioso das tradiçõesnacionaes.{VIII}
Bem como a vida dos individuos a vida dos povos é dilatada ou curta. Assimmuitas nações, que existiam robustas e altivas durante a edade média,annullaram-se ou desappareceram, absorvidas umas por estados mais poderosos,desmembradas outras pelas conveniencias politicas; e Portugal,apparentemente{10} debil na origem,mas que por milagres d'esforço e de perseverança chegou a constituir a naçãomais forte e audaz da Europa, vive ainda, e encontrará a sua defensão emsaberem seus filhos repellir, com energia, quaesquer suggestões traiçoeiras outentativas violentas contra a terra que livres herdaram, e onde livres queremmorrer.
Qual tem sido, porém, a causa d'essa longa vida, d'esse vigor da juventude eda edade viril, d'essa tenacidade que se conserva ainda no seio da decrepidez?É o